(...) Sem
sombra de dúvida sou, antes de mais, o cão! O perdigueiro amestrado, o filho do
lobo, do chacal ou do coiote! A aceitar por troca, a cada peça que te trago às
mãos, uma palmada no lombo ou um afago no focinho! Está bem! Está bem! É mesmo
assim! E não tarda a ouvir-te repetir: busca, busca! Como se carecesse de ser
incitado ao que é inerente á razão do meu ser: a caça aguardada dia após dia em
cada ano! Que raio! E eu quero é ver-me, no futuro, a arfar como um cão velho!
A já não poder embriagar as narinas com o cheiro fresco do sangue das presas;
nem a desembaraçar da confusão das penas arrancadas, que se apegam à minha boca,
e quase me asfixiam.... Então aí é que estou para conhecer o fim que me espera!
Se o abandono na rua, o desprezo ou o tiro de misericórdia!
Lumiar, Lisboa, 2 de dezembro de 2015